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O que o Scream poderia ensinar ao SXSW

Fui convidado pelo IAB Brasil para liderar junto com Babi Bono, chefe de estratégia da Digital Favela, uma Master Class sobre as tendências apresentadas no SXSW. A primeira coisa que falei quando recebi o convite foi “mas eu não fui para o SXSW”. E a resposta que recebi foi maravilhosa: “por isso mesmo. Queremos também o olhar crítico de quem tem acesso ao que foi discutido lá, mas estava aqui.” 

E na primeira reunião para definirmos o roteiro desta Master Class, chegamos à tese de que “não vamos repetir, como papagaios, tendências estrangeiras, com uma autoestima de colonizado. Vamos ter um olhar crítico e mostrar também o que vimos nos eventos brasileiros e que não foi falado no evento estrangeiro”.

Isso é o que fazemos há 5 anos no Scream Festival. Enquanto no SXSW há sempre uma visão de futuro em que parece que as pessoas estão sendo arrastadas sem escolha pela onda do novo, no Scream temos discutido há anos sobre a importância do fator humano para que a inovação se realize.

Busquei resumir isso numa fala recente sobre a curva de adoção da inovação. Esta curva mostra que qualquer coisa nova começa sendo adotada por um pequeno público mais aberto (os early adopters), indo em seguida para o grande público, que se divide em dois: os mais reticentes e os mais entusiasmados (late e early majority). Por fim, há os retardatários (laggards), aquela parcela do público que resiste enquanto pode a adotar uma inovação.

Há um “vale da morte” nesta curva de adoção. Ele está na migração dos early adopters para a early majority. Ou seja, se o grande público não adotar o novo, a inovação morre. Vejam o Club House, ou o Blueray: morreram porque não fisgaram as pessoas comuns. O que quero dizer com isso: o grande público tem o poder de definir se a inovação seguirá ou não. Ao contrário do que fazem parecer as palestras do SXSW, as pessoas têm escolha sim, podem adotar ou não algo novo, e se elas não adotarem, acabou a história. São os inovadores que não têm escolha: precisam convencer a maioria.

Outro ponto que poderíamos ensinar é sobre o fim da mentalidade de criar unicórnios. A maior parte das pessoas não sabe o que quer dizer unicórnio no jargão do mundo da inovação: são empresas que valem mais de US$ 1 bilhão. Estas mesmas pessoas, mesmo após ter essa informação, não entenderiam  porque empresas que dão prejuízos multimilionários podem valer tanto. Num momento de crise financeira, como o atual, fica claro como esse modelo não é sustentável (ele parte da premissa de que haverá alguém disposto a aportar capital, pagando mais caro no futuro, do que quem aportouhoje).

O padrão de empresas inovadoras apresentadas no Scream segue outra lógica: passos bem medidos, crescimento consistente, responsabilidade com todos os stakeholders. Nem a Zygon, a Meninos Rei ou a Amávia, para citar alguns exemplos, fizeram pre-sede, serie A ou IPO. Todas procuraram atrair e atender bem clientes, engajar colaboradores, gerar valor para sociedade e fazer a roda do negócio girar de maneira sustentável, ao invés de captar dinheiro de um fundo que já entra no negócio com data para sair.

Por fim, queria destacar a busca do Scream pela inspiração na ancestralidade baiana. Nossas raízes indígenas e negras, com toda sua diversidade, oferecem uma forma de enxergar o futuro muito diferente daquela vista no Vale do Silício ou em Austin. Se tentarmos copiar soluções americanas, seremos sempre versões apequenadas do estrangeiro. Mas quando usamos nosso repertório cultural para apresentar novas soluções, estas são únicas, pois partem de uma visão de mundo original e aí, ao invés de sermos concorrente menores, passamos a ser referência.

Em resumo, adoraria convidar Amy Webb, a grande futurista do SXSW, para o Scream. Não só para palestrar, mas para ter acesso ao olhar sobre inovação que se tem em Salvador. O olhar de Ubiracy Pataxó, Adelino Montalverne, Paulo Rogério, Monique Evelle, só para citar alguns nomes. Tenho certeza de que Amy aprenderia muito conosco.

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